12/13/10

A Beleza do Efêmero

Quando regressei de Portugal, após doze anos de atividades missionárias, a Junta de Missões Mundiais da CBB me colocou à disposição um apartamento na Tijuca, RJ, próximo ao Clube Monte Sinai, até que Deus definisse o meu novo destino. Daquele prédio avistava facilmente a sinagoga vizinha e as suas reuniões semanais. Uma das semanas mais intrigantes que observei foi quando os judeus celebravam a Festa dos Tabernáculos.

O rabino Harold Kushner termina seu livro “Quando Tudo Não é o Bastante” falando da Festa dos Tabernáculos (Sukkot, em hebraico). Ele diz que, na vida de Israel, ela era um protótipo do Dia de Ação de Graças, pois os judeus agradeciam, no outono, a colheita realizada. E até hoje, para a festa, a tradição judaica ergue um barracão tosco, com algumas tábuas e galhos de árvores. E convidam os amigos que chegam para beber vinho e comer frutas. Os judeus celebram ali a beleza das coisas efêmeras: pois o próprio barracão será destruído no final da semana, as frutas frescas se estragarão em breve, caso não sejam logo consumidas. E os amigos talvez não fiquem com eles tanto tempo quanto poderiam desejar.

Ivan Lins e Victor Martins escreveram uma música que eu gosto muito, chamada “Guarde nos olhos”. Quando a ouço, imagino uma família pobre saindo do interior, indo para uma grande capital, e então o pai diz: “Guarde nos olhos a água mais pura da fonte, beba esse horizonte, toque nessas manhãs. / Guarde nos olhos a gota de orvalho chorado, guarde o cheiro do cravo, do jasmim, do hortelã. / Guarde o riso como nunca se fez, corra os campos pela última vez. / Guarde nos olhos a chuva que faz as enchentes, vai um pouco da gente rumo a capital. / Vai dentro da gente, vamos pra capital.” A letra é um convite para guardarmos a beleza das coisas simples do campo, que não podemos comprar e revê-las na capital.

O rabino nos ensina que “o mundo está cheio de coisas bonitas..., mas temos que as apreciar logo, porque não vai durar muito.” Pare de correr, e valorize as pessoas e os amigos que estão à sua volta. Se ainda tem seus filhos consigo, dê um grande abraço neles, beije-os sempre, diga que os ama, e curta este momento porque ele é brevíssimo. Saiba que, em muitas famílias, as melhores recordações da vida chegam da fase em que eram crianças. Se você tem um amigo especial, leal, que enche sua vida de generosidade e significado, valorize-o, antes que ele não esteja mais ao seu lado. Se seus pais ainda estão vivos, e moram perto de você, abrace-os com amor, e aproveite as oportunidades para que saibam o quanto são importantes na sua vida. Se você tem tido uma boa companhia com quem você divide momentos de alegria, valorize esses momentos. A vida aqui não vai durar para sempre.

Gosto de fotografia. Uma vez, na Grande Lisboa, fiz minha família esperar até tarde, na praia, para que pudesse tirar fotos do pôr-do-sol. Aí, quando o sol já declinava, entrou uma nuvem no horizonte, e acabei não tirando uma foto sequer. A família protestou pela espera, mas eu só queria valorizar e celebrar aquele instante. Acorde mais cedo e veja o sol nascer. Sinta o cheiro de uma flor e repare a sua beleza. Ouça o canto dos pássaros e convide seu amigo para almoçar com você. Olhe à sua volta, e contemple as coisas bonitas que estão próximas. Algumas delas são gratuitas, mas efêmeras. É tempo de ser feliz com quem você ama. Admire tudo isso, e aprecie logo, pois não vai durar muito.

Não se esqueça também de “praticar a justiça, amar a misericórdia e andar em humildade com o seu Deus”, conforme nos diz o profeta (Mq 6.8). Admire as coisas bonitas e simples ao seu redor, esta é uma das maneiras de dar sentido à vida e tirar o máximo de proveito dela.
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